(Reuters) – Hussam al-Masri, o jornalista da Reuters morto por fogo israelense na segunda-feira, enquanto trabalhava em uma transmissão de vídeo ao vivo no Hospital Nasser, em Gaza, relatou o sofrimento dos civis durante a guerra ao mesmo tempo em que vivia em uma tenda e lutava para encontrar comida para sua família.
Masri, de 49 anos, era um cinegrafista experiente cuja abordagem positiva nas situações mais perigosas o tornou popular entre a unida comunidade de jornalistas de Gaza, segundo colegas.
‘Amanhã será melhor’, dizia ele, mesmo quando as condições no enclave palestino aprofundaram ainda mais o desespero e a fome nos meses que antecederam sua morte.
Foi assim que ele terminou sua última conversa com Mohamed Salem, jornalista sênior de imagens da Reuters, que conhecia Masri desde 2003 e trabalhou com ele em Rafah, no sul de Gaza, no ano passado.
Salem, que deixou Gaza no final de 2024, mas manteve contato diário com Masri até a manhã de segunda-feira, disse que seu otimismo e sorrisos faziam com que fosse um prazer trabalhar com ele.
A editora-chefe da Reuters, Alessandra Galloni, disse que ‘Hussam era profundamente dedicado a contar a história de Gaza para o mundo’.
‘Ele era forte, firme e corajoso nas circunstâncias mais desafiadoras. Sua perda é profundamente sentida por todos aqueles nesta redação que trabalharam com ele.’
O corpo de Masri foi recuperado ao lado de sua câmera em uma escada externa do hospital, de onde ele transmitia a vista de Khan Younis quando o ataque israelense ocorreu, como mostra o vídeo da Reuters.
Uma segunda explosão na escadaria, minutos depois, matou pelo menos 19 pessoas, incluindo equipes de resgate e quatro jornalistas que trabalhavam para veículos como a Associated Press, Al Jazeera e outros. Um dos quatro, Moaz Abu Taha, forneceu imagens para a Reuters.
O fotógrafo da Reuters, Hatem Khaled, foi ferido no segundo ataque quando estava nas escadas filmando o resultado da primeira explosão.
O Exército de Israel disse à Reuters nesta terça-feira que os jornalistas da Reuters e da Associated Press não eram ‘um alvo do ataque’. O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, disse que Israel lamentava profundamente o que ele chamou de ‘trágico acidente’ no hospital.
O Comitê para a Proteção dos Jornalistas, que, após os ataques, afirmou ter documentado um total de 189 jornalistas palestinos mortos por Israel durante a guerra em Gaza, pediu que a comunidade internacional responsabilize Israel e disse que ‘não se deve mais permitir que os perpetradores ajam com impunidade’.
A esposa de Masri, Samaher, de 39 anos, tem câncer. Ele estava tentando tirá-la de Gaza para tratamento antes de ser morto. O casal tinha quatro filhos: Shahd, de 23 anos, Mohammed, de 22, Shatha, de 18 e Ahmad, de 15.
Masri nasceu e foi criado em Khan Younis, no sul da Faixa de Gaza. Ele obteve um diploma em jornalismo antes de começar a trabalhar como freelancer em 1998, inclusive para a Palestinian Broadcasting Corporation. Sua paixão pelo jornalismo surgiu do desejo de mostrar ao mundo o que estava acontecendo em Gaza, disse sua esposa.
‘Esse era o papel de Hussam na imprensa: entregar a verdade aos meios de comunicação’, disse seu irmão, Ezzeldin al-Masri. ‘A câmera está gravando, seja a nosso favor ou contra nós. A câmera registrou se havia homens armados palestinos ou forças de ocupação israelenses.’
A família fugiu de casa quando os militares israelenses ordenaram que todos os civis deixassem Khan Younis ao expandir sua ofensiva logo após o início da guerra em resposta aos ataques do Hamas em outubro de 2023.
Mais tarde, a família soube que sua casa havia sido destruída.
Em um vídeo que gravou de si mesmo e publicou em um grupo do WhatsApp compartilhado com outros jornalistas no ano passado, Masri descreveu sua dor pela destruição de sua casa e do bairro.
‘Não resta nada além de ruínas — ruínas sobre as quais choramos’, disse ele. A família retornou a Khan Younis em julho do ano passado, abrigando-se em uma tenda.
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Masri começou a trabalhar para a Reuters em Rafah, perto da fronteira com o Egito, em maio de 2024, oito meses após o início do conflito. Em sua função, ele estava envolvido em transmissões ao vivo de campos de deslocados e registrava a entrada de ajuda humanitária pela passagem de fronteira de Rafah.
Desde que retornou a Khan Younis, foi responsável pelo feed que a Reuters transmitia diariamente do Hospital Nasser, que fornecia uma exibição constante em tempo real de Gaza e era usado pelos clientes de mídia da Reuters em todo o mundo.
‘Hussam fez essa tarefa extenuante dia após dia durante meses, principalmente do Hospital Nasser, mas também de Rafah quando a história merecia’, disse Labib Nasir, editor visual da Reuters para o Oriente Médio e Norte da África.
Masri também relatou histórias sobre o sul de Gaza, muitas vezes usando os contatos que havia desenvolvido no hospital para fornecer relatos vívidos sobre o desastre humanitário que se desenrolava, incluindo histórias sobre a desnutrição em Gaza.
Sua última reportagem, filmada no sábado, mostrou famílias lamentando corpos de parentes, inclusive crianças, mortos em ataques israelenses que tiraram pelo menos 62.000 vidas palestinas na guerra.
Masri escolheu cuidar da transmissão ao vivo no Hospital Nasser em parte porque acreditava que era o lugar mais seguro de onde poderia operar, disse Salem, que falava com ele todas as manhãs enquanto ele montava sua câmera.
Durante sua última conversa, Masri descreveu como a vida havia se tornado difícil em Gaza e a luta para encontrar comida.
Horas depois, em uma imagem capturada pela Reuters, seu corpo foi colocado em uma maca.
(Reportagem da Reuters em Gaza)
Fonte: antena1