Queijo de leite cru da Pardinho artesanal conquista os Estados Unidos

GastronomiaQueijo de leite cru da Pardinho artesanal conquista os Estados Unidos

Em um marco histórico para a produção de queijos artesanais no Brasil, Bento Mineiro, 35 anos, acaba de se tornar a primeiro brasileiro a exportar um queijo de leite cru para os Estados Unidos. Foram 64 peças de mandala que chegaram de avião em Nova York, em torno de 650 kg, para seu lançamento no último sábado, 28 de junho, no Summer Fancy Food Show, maior feira de comida fina do mundo. Feito em tacho de cobre e maturado em tábua de madeira, ele agora integra o seleto portfólio da Essex St Cheese Co, importadora americana conhecida por trabalhar com grandes nomes do queijo artesanal mundial, como o francês comté do Forte Marcel Petit, o italiano parmigiano reggiano do curador Cravero ou ainda o cheddar tradicional inglês da queijaria Montgomery.

Bento Mineiro, da Pardinho Artesanal Foto: Débora Pereira/SerTãoBras

Cheese grading

Antes de ser lançado pela importadora, o mandala passou por dois anos de “cheese grading”, o genial método de avaliação da Neal’s Yard, que acompanhou as evoluções de aromas e sabores do queijo, em diferentes estações do ano, para definir o perfil sensorial da peça “ideal” que será apresentado em Nova York.

Apresentação do mandala em Nova York para uma centena de cheesemongers Foto: Pardinho Artesanal/Acervo Pessoal 

 

“Sua textura é realmente sedosa, tem acidez delicada de dar água na boca, notas tropicais ricas, lichia, pitaya, manga, banana-da-terra, final marcante, persistente no paladar e muito equilibrado em sal”, disse Rachel Juhl, especialista sensorial da Essex St Cheese Co.

“Este queijo fantástico é do Brasil!”

O queijo foi descoberto por Jason Hinds, expert inglês em queijos, em 2022. “Fui convidado por Débora Pereira para ser jurado no incrível 2º Mundial do Queijo, em setembro de 2022. Minha carreira com queijos de alto valor agregado tem mais de 30 anos e me levou a todos os continentes do mundo, exportando queijos britânicos da Neal’s Yard Dairy, salvo a América do Sul.  Eu estava animado em provar o queijo brasileiro, que nunca tinha visto na Europa nem nos Estados Unidos. Fui recebido em São Paulo por Bento Mineiro e fomos direto para sua fazenda, 3 horas a oeste de São Paulo. Tudo me impressionou, uau, este queijo fantástico é do Brasil! Bento e Vanessa Alcolea, responsável da fabricação, disseram que um dia gostariam de exportar seus queijos. De preferência para os EUA em vez da Europa, pois Bento sentiu que, além de estar mais próximo, o Brasil se volta mais para a América do Norte do que para a Europa em termos de comércio. Como fundador e um dos proprietários da Essex St Cheese Co, eu quis ajudar por vários motivos: o mundo não conhece o queijo brasileiro e seria desafiador e muito divertido ser o primeiro a introduzi-lo em um novo mercado”. Ele é conhecido por só selecionar queijos de altíssima qualidade, para um público de alto nível, principalmente de leite cru e fabricados em fazendas.

Jason com diferentes idades do mandala Foto: Pardinho Artesanal/Acervo Pessoal 

Para Jason, “a indústria brasileira de queijos especiais é incipiente, mas repleta de pessoas enérgicas e brilhantes, todas trabalhando juntas e apaixonadas por queijos, visitei várias outras fazendas que também fizeram um trabalho incrível. Da mesma forma, o setor emergente de queijos especiais do Brasil tem muitos paralelos com os EUA, cujo próprio queijo especial, há apenas 30 anos, estava apenas surgindo e em um estágio semelhante ao equivalente brasileiro hoje. As paisagens, o ambiente e, no caso do Pardinho, a raça de gado Gir, tudo era novo para mim, muito inspirador. Nossas esquipes falam a mesma língua em termos de práticas agrícolas e qualidade do leite. Mas acima de tudo, a Essex St Cheese Co está importando o mandala porque ele é delicioso, único, especial para um público apaixonado e curioso de consumidores.”

Queijo tropical em terras temperadas

A produção de queijos na fazenda começou em 2016 com leite cru de gado Gir. “Na sequência, cruzamos Gir com Jersey e hoje temos dois rebanhos separados, de Gir e Girsey”, explica Vanessa. O mandala é de Girsey, o que dá uma umidade untuosa super apreciada no queijo. A vaca Gir, raça zebuína da Índia desenvolvida geneticamente  pela sua rusticidade no Brasil, dá um leite excelente para queijos de cura longa, com alto teor de gordura e proteína.

Vacas da raça Gir Foto: Débora Pereira/SerTãoBras

Persistência para as formalidades

A exportação não foi um processo simples. “Foram três anos de ajustes, desde o primeiro contato com Jason em 2022, no Mundial do Queijo no Brasil, até a aprovação final do FDA (agência reguladora americana). Os queijos viajaram de avião, em embalagens com gelo seco, manta térmica e monitoramento constante de temperatura. “Foi muito importante o apoio do MAPA, tanto o serviço de inspeção federal quanto a Vigiagro. Foi um grande trabalho de nossa equipe também”, disse Vanessa, que integra um time de 30 pessoas. “Desde a seleção genética dos animais, manejo, sanidade, reprodução, ordenha, administração, produção, controle de qualidade… Não estaríamos nos EUA sem a mão de cada um dos nossos colaboradores”, disse ela.

Vanessa Alcolea, que desenvolveu a receita para a Pardinho Foto: Débora Pereira/SerTãoBras

 

Prioridade do mercado interno, olhos no mundo

Apesar da demanda externa, Bento Mineiro garante que o mercado brasileiro não ficará desabastecido. Atualmente, a produção diária gira em torno de 1.300 a 1.500 litros de leite, 60 toneladas queijo por ano. O mandala representa 30% da gama de seis queijos, todos de leite cru e curados longo tempo. “A participação do queijo artesanal no Brasil ainda é pequena, estimada em 5% a 7% do total consumido. Queremos fortalecer esse mercado, mas também abrir portas para outros produtores”, explica Bento Mineiro. O Mandala chegará às mãos dos cheesemongers, os queijistas dos EUA, com preço similar ao de um comté francês de alta qualidade — entre US$ 80 e US$100 o quilo. A estreia oficial acontecerá em um evento exclusivo, com degustações e a presença de especialistas internacionais.

O queijo é feito em tacho de cobre Foto: Débora Pereira/SerTãoBras

Outros continentes no radar

Enquanto os Estados Unidos são o primeiro passo, a Pardinho já mira outros mercados. Contatos com importadores estrangeiros estão em andamento, e a participação no Mondial du Fromage, na França, pode ser a próxima oportunidade para expandir o reconhecimento do queijo brasileiro.“Isso é só o começo. Queremos mostrar que o Brasil tem terroir e técnica para produzir queijos únicos”, celebra Bento. Com 10 anos de história, a Pardinho Artesanal não apenas quebrou paradigmas sanitários e comerciais, mas provou que o queijo tropical brasileiro tem lugar garantido entre os grandes do mundo.



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